quarta-feira, 5 de junho de 2013

Serial killer, Adachi 1969



A flânerie adquiriu no Ocidente uma aura- a aura!-, um stimmung fenomenogógico espectralmente utópico: nela  e por ela, o modus vivendi funcionalista da “divisão social do trabalho” capitalista era esterilizado: ao flertar com as vitrines e os transeuntes, deslocamo-nos e divergimo-nos , mas não apenas no espaço; diferimos, dessacralizamos o tempo que deveria ser destinado à produção, preenchido pelo modus operandi. Este diferir é democrático- ou antes: qualquer, casual, brincante. Serve ao artista, à criança, à puta, ao serial killer ( não seriam todos estes – antes da divisão social do trabalho, nosso vero vírus psicótico- flâneurs?). É isto que nos sussurram estas circunvoluções suburbanas, estas digressões inscritas sobre o cal e o concreto, estes mabusianos travellings fantasmas, estes devires-derivas: por aqui passou ( foi) um serial killer de  nome, identidade... ao filme pouco importa, como a qualquer ente digno de pronome: o seu espaço-tempo fantasma incrustou-se no espaço-tempo gregário e laboral dos que se apropriam da rua como meio- trajetória, via expressa, sarjeta- para fins que não lhes dizem respeito: gregários, laborais, quaisquer. Os travellings trânsfugas, os zooms estrábicos, os faux-raccords zuretas de Adachi tentam justamente inventariar este espaço ininventariável dos seres que habitam a cavidade, a fresta, a  réstia: crianças, mendigos, mortos,anjos e serial killers. E não é a estes zumbis ontológicos, grafittis do possível- nutridos com o sangue, o esperma e os pesadelos dos homens de bem e de ponto- que se destina toda arte digna de memorabilia?

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