sábado, 18 de fevereiro de 2012

More, Barbet Schroeder: The Self and me



O self foi uma invenção burguesa e metafísica; muitos filmes do marasmo pós-68 apostaram na auto-destruição como meio terminal de transcendência ( ó, Satã, livrai-nos do cárcere privado do ego, amém) e resistência- na UTI embora- ao mundo burguês. A criança secreta de Philippe Garrel (1982) é a obra-prima tardia deste movimento, desta “vasta inflexão curvilínea em direção ao útero”, como algum alemão chamou a morte. No caso, por “overdose geracional”. More (Schroeder, 1969) é o seu aborto temporão; filme errante, histérico (Living theatre de banheirão, pessimamente declamado) e supliciado por um esquema cromático Jugendstil. A rigor, estas poderiam ser qualidades, mas claramente Schroeder não sabe de onde vem nem para onde vai, se do cu para a boca ou vice-versa ( e creiam, esta oposição é séria: Logos versus pulsão). Provavelmente, sofria dos mesmos surtos psicóticos que os heroinômanos do filme, um casal de crias pequeno-burguesas, albinas e narcisistas- Mimsy Farber e Klaus Grünberg, anoréxicamente chatos. Mas a forma circunavegante e claustrofóbica do filme põe uma questão: não seria o girar sobre si mesmo que o filme reproduz- julgando-se embora entre Cila e Caribde- exatamente o espelho do movimento entrópico de uma impossível resistência- existencial, política- no inverno pós-68?

O que os utopistas oba-oba daquela geração talvez tenham concluído, mau grado seu, era que a morte do mundo burguês era na verdade ( e apenas) o assassinato dos seus pais- uma questão familiar, freudiana, não epocal/histórica/estratégica ( a rigor, indiscerníveis no anti-Édipo deleuziano). As suas bombas eram uma cusparada nos estoques do pai patrão; suas barricadas uma cagada na marta da mãe; suas guerrilhas e auto-imolações públicas o estupro da filha do jardineiro. E ao fazer este link, o que me vem à cabeça é o plano em Enfant secret de uma desoladoramente abstêmia Anne Wiazenski no vagão de trem, no caminho do velório da mãe.


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Mas More é um filme que registra este movimento como um sismógrafo-topeira, como obra ou corpo que menos especula ou reinventa que res-sente uma experiência maior do que seu próprio ego ( cu, no caso). O grande tratado logofílico e apocalíptico, a grande cerimônia fúnebre e exorcista desta prematura ( et dejà trop tard) sensação de game over que assolou uma geração viria apenas em 1973, e chamar-se-ia A mãe e a puta.

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