terça-feira, 15 de maio de 2012

Shadows



Rever Shadows me atiça a pulga que desde sempre cultivei sob o lóbulo esquerdo. Cassavetes como o grande diretor que me interessa começa com Mulher sob influência, e  compreende basicamente a "quatrilogia" da performance, com este, Killing, Opening night e Amantes. Nestes filmes, Cassavetes radicaliza a lição de Rouch ( e por que não de Renoir?): leva a performance ( o ser aparência, o encarnar-se-encenar-se aparência) aos quatro cantos da cena, quebrando quarta parede, copa e cozinha- mas com uma nonchalance, uma cirúrgica precisão irônica, uma paixão esquizo que o coloca muito à frente da démarche intelectualista dos "performers" de um grupo Zanzibar, por exemplo. Aqui, vida e cena são indistinguíveis- e tire daí as implicações políticas, psicológicas e sociológicas que quiser também, só que isto não é o principal.
Mas há trechos em Shadows – centrados na inestimável figura de Ben Carruthers e sua gang de grotowskianos beira de calçada, sobretudo aquela briga final- que claramente colocam o filme como um condensado- summa da melhor parte de sua carreira, em estado de latência ( ma non troppo). Em Cassavetes ( como em Rouch), é o corpo o centro, a cena, o palco; tudo é por ele deflagrado. Plano-sequência é o único modo de tornar visível esta coalescência entre corpo e mundo- plano e  cena. O meio apenas  o irradia ou ressoa; em seus melhores filmes, o “meio” vai restringindo-se consideravelmente ( uma casa habitada por uma deusa pática em Woman, um club streapper-mausoléu em Killing, um teatro assombrado em Opening). Tudo se concentra e se descentra absolutamente neste cadinho transfigurado pelas imagens e energias que o corpo emana. Em Shadows, o espaço é mais rarefeito, dialogal: a cidade ainda pulsa pelos interstícios do gesto, e  divide com o corpo o privilégio da cena. Cassavetes começa paranóico e vai progressiva e sacramente abraçando o esquizo, a indistinção entre voz e escuta, corpo e  alma, Logos e cu. Se o corpo ainda trafegava pelo mundo e levava um lero com ele, agora o mundo vai se corporificando ( possuindo? possessão?), se encarnando no espaço carceral e Outro do corpo, entre a axila e a aurora em Ursa Maior.

Atualização revista

Pautas especias na nova atualização da Cinética, com Edgar Navarro e curtas brasileiros. Link para dois textos meus sobre Corpo presente de Marcelo Pedroso e Ela morava na frente do cinema do Leonardo Lacca.

http://www.revistacinetica.com.br/corpopresentepedroso.htm


http://www.revistacinetica.com.br/elamorava.htm

terça-feira, 8 de maio de 2012